
Desenvolvimento moral
O reconhecimento de Kohlberg surgiu nos anos 80, embora os seus trabalhos fossem conhecidos e debatidos no mundo restrito dos académicos que se dedicavam ao estudo do desenvolvimento moral. Isto deveu-se á ineficácia do modelo curricular da clarificação de valores, durante os anos 60 e 70. Por outro lado, a sua teoria abriu uma porta de esperança para os que vêem a sociedade norte-americana e as sociedades europeias ameaçadas pela corrupção, criminalidade e crescente egoísmo social.
O interesse por esta teoria de deve-se, também, à seriedade e à monumentalidade do trabalho de investigação conduzido por ele ao longo de três décadas, sem nunca se desviar do seu objectivo central: o estudo do desenvolvimento moral e de uma abordagem à educação moral preocupada com a questão da justiça. Nessa caminhada, Kohlberg soube, como poucos, associar os contributos da psicologia do desenvolvimento, em particular dos trabalhos de Piaget, da filosofia moral, nomeadamente o pensamento de Kant e da sociologia política, com particular destaque para o liberalismo social de John Rawls.
O interaccionismo social da teoria da educação moral de Kohlberg e, em particular, a abordagem comunidade justa, é influênciada pela teoria educacional de John Dewey. Kohlberg rejeita quer o individualismo romântico quer o colectivismo da transmissão cultural, propondo uma teoria que estabeleça uma síntese criativa entre o individual e o social na educação, baseada na noção de interacção e interdependência entre o organismo e o ambiente, entre a pessoa e o meio, entre o sujeito e o objecto, à boa maneira de Jean Piaget. Epistemologicamente, Kohlberg assume-se como um continuador de Piaget, rejeitando a noção de que o conhecimento seja o produto da cultura ou do inatismo.
Ao invés, o conhecimento constrói-se a partir da interacção do sujeito com o objecto, do organismo com o meio, não fazendo sentido algum a separação de um do outro. Esta ligação íntima entre o individual e o social assume uma lugar central na moral de Kohlberg. A justiça surge como o expoente máximo dessa ligação, porque pressupõe que o indivíduo seja capaz de equilibrar os seus interesses e pontos de vista com o os interesses mais gerais da sociedade. A partir dos anos 70, com o início do seu envolvimento na criação de programas curriculares de educação moral, em cenários de escolas secundárias, Kohlberg passou a acentuar mais o carácter social da moralidade, aproximando-se de alguns aspectos da moralidade durkheimiana e dos programas educativos postos em prática em alguns kibbutz israelitas. Esse movimento levou Kohlberg a dar cada vez mais importância ao desenvolvimento de um estádio 4 da moralidade e ao papel da escola e do professor na promoção do desenvolvimento moral. O maior contributo de Kohlberg para o estudo do desenvolvimento moral foi, sem dúvida, a sua teorias dos estádios do desenvolvimento moral.
- I - Nível Pré-Convencional - As normas sobre o que é bom ou mau são respeitadas atendendo às suas consequências(prémio ou castigo) e ao poder físico dos que as estabelecem
1º Estádio - Orientação pela obediência e punição. Deferência egocêntrica face ao poder e à autoridade.
2º Estádio - Estádio da individualidade instrumental. Orientação egoísta. A acção correcta é aquela que satisfaz as necessidades do indivíduo e apenas ocasionalmente dos outros. Igualitarismo radical.
– II – Nível Convencional - Vive-se identificado com um grupo e procura-se cumprir bem o próprio papel, respondendo às expectativas dos outros, mantendo a ordem estabelecida (a ordem convencional).
3º Estádio - Orientação bom rapaz, linda menina. Orientação para a aprovação e para agradar aos outros. Conformidade aos estereótipos sociais.
4º Estádio - Orientação para a manutenção da ordem e da autoridade. Respeito pela autoridade e pelas expectativas que a sociedade deposita em nós.
– III – Nível pós-convencional - Há um esforço para definir valores e princípios de validade universal, isto é, acima das convenções sociais e das pessoas que são autoridade nos grupos. O valor moral reside na conformidade com esses princípios, direitos e deveres que podem ser universais.
5º Estádio - Orientação contratual legalista. O dever é definido em termos de contrato. deferência para com o bem estar dos outros e pelo cumprimento dos contratos.
6ºEstádio - Orientação pelos princípios éticos. A acção é conforme a princípios universais. Primado da consciência individual e pelo cumprimento do dever.
A teoria de Kohlberg é um dos exemplos mais significativos de uma teoria moral centrada na defesa dos princípios éticos e preocupada com o desenvolvimento do raciocínio moral, em vez da mera defesa das convenções sociais, regras de conduta e leis. O que é que Kohlberg entende por princípio ético? Antes de mais, é um procedimento ou um conjunto de orientações para habilitar a pessoa ao confronto de escolhas morais alternativas. Constitui uma forma universal de tomada de decisões morais, com base na lógica formal e na razão. O princípio ético constitui uma padrão universal que orienta a reflexão sobre questões morais. Por outro lado, o princípio ético refere-se a uma forma mais avançada e mais madura de encarar o conceito de justiça, o qual, no entender de Kohlberg, define o ponto de vista moral. De uma certa forma, o princípio ético significa duas coisas: um procedimento racional para orientar a reflexão sobre questões morais e um conteúdo identificável com o conceito de justiça.
O que é que Kohlberg entende por justiça? Entende que a justiça é o mesmo que igualdade e universalidade dos direitos humanos. A justiça é tratar, com igualdade, todas as pessoas, independentemente da sua posição social. É tratar cada pessoa como um fim e não como um meio. Assemelha-se ao imperativo categórico de Kant. É o mesmo que o respeito pela dignidade humana e pressupõe o respeito pela reciprocidade. A justiça pressupõe a preocupação pelo bem estar dos outros. De uma certa forma é o mesmo que o maior bem para o maior número. Kohlberg rejeita quer a ideia de que a moralidade é a expressão das normas do grupo quer a ideia de que a moralidade é uma questão de gosto e de preferência individual. Os princípios éticos não derivam da sociedade ou da cultura. Eles são autónomos, fazem parte da natureza humana e estão inscritos na ordem cósmica